Comentário ao Evangelho do dia (Mc 8,14-21) feito por:
Jean Pierre de Caussade (1675-1751), jesuita
Abandono na Providência divina (§26)
«Ainda não entendestes nem compreendestes?»
Se perfurássemos o véu, e se estivéssemos vigilantes e atentos, Deus revelar-Se-nos-ia sem cessar e usufruiríamos da Sua acção em tudo quanto nos acontece, dizendo perante todas as coisas: «Dominus est, é o Senhor!» (Jo, 21, 7). E descobriríamos em todas as circunstâncias um dom de Deus.
Consideraríamos as criaturas frágeis instrumentos nas mãos de um obreiro omnipotente; e reconheceríamos sem dificuldade que nada nos falta, e que a contínua atenção de Deus O leva a proporcionar-nos em cada instante aquilo que nos convém. Se tivéssemos fé, teríamos boa vontade para com todas as criaturas; haveríamos de as acariciar, interiormente gratos pelo facto de elas servirem e se tornarem favoráveis à nossa perfeição, aplicada pela mão de Deus. Se vivêssemos ininterruptamente uma vida de fé, estaríamos em permanente comércio com Deus, falando com Ele a todo o momento.
A fé é intérprete de Deus; sem os esclarecimentos que ela proporciona, não compreendemos a linguagem das criaturas. Esta é uma escrita em números, onde apenas vemos confusão; uma amálgama de espinhos, de onde não nos ocorre que Deus possa falar. Mas a fé permite-nos ver, como Moisés, o fogo da caridade divina que arde no seio destes espinhos (Ex 3, 2); a fé dá-nos a chave destes números, permitindo-nos descobrir, no meio da confusão, as maravilhas da sabedoria do alto. A fé confere um rosto celeste a toda a terra; é por meio dela que o coração é transportado, arrebatado, para conversar no céu. [...] A fé é a chave dos tesouros, a chave do abismo, a chave da ciência de Deus.
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