Comentário ao Evangelho do dia (Lucas 10,21-24) feito por
Cardeal John Henry Newman (1801-1890), presbítero, fundador de comunidade religiosa, teólogo
"Esperando por Cristo", Sermões Pregados em Várias Ocasiões, nº 3
"Felizes os olhos que vêem o que vós vedes"
Durante séculos, antes que Jesus tivesse vindo à terra, todos os profetas, um após outro, estiveram no seu posto, no alto da torre; todos o esperavam e perscrutavam a sua vinda através da obscuridade da noite. Vigiavam sem cessar para surpreender o primeiro brilho da aurora...: "Deus, a ti, meu Deus, eu busco desde a aurora. A minha alma tem sede de ti, como terra árida, esgotada, sem água" (Sl 62,2)... "Ah! se tu rasgasses os céus e descesses! As montanhas fundiriam na tua presença, como se o fogo as atingisse... Desde as origens do mundo que os olhos nada puderam ver, meu Deus, das maravilhas que preparaste para aqueles que, esperando, estiveram unidos a ti" (Is 64,1; 1Co 2,9).
Contudo, se alguma vez houve homens que tiveram o direito de se apegarem a este mundo e dele não se desinteressarem, foram os servos de Deus; a terra tinha-lhes sido prometida como herança e, de acordo com as próprias promessas do Altíssimo, ela devia ser a sua recompensa. Mas a nossa verdadeira recompensa diz respeito ao mundo que há-de vir... E também eles, esses grandes servos de Deus, ultrapassaram o dom terrestre de Deus, apesar do seu valor, para se apegarem a promessas mais belas ainda; em nome desse esperança, sacrificaram aquilo cuja posse já detinham. Não se contentaram como nada menos do que a plenitude do seu Criador; procuraram ver o rosto do seu Libertador. E, se fosse preciso que, para isso, a terra se quebrasse, os céus se rasgassem, os elementos do mundo fundissem para que, enfim, ele aparecesse, então, mais vale que tudo se desfaça, antes que continuar a viver sem ele! Tal era a intensidade do desejo dos adoradores de Deus em Israel, que esperavam aquele que havia de vir... A sua perseverança prova que havia alguma coisa a esperar.
Também os apóstolos, depois de o seu Mestre ter vindo e regressado aos Céus, não ficaram atrás dos profetas na acuidade da sua percepção nem no ardor das suas aspirações. O milagre da espera na perseverança continuou.
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